Milho, a planta mais especializada do mundo?
O milho
Milho
é o nome vulgar dado a uma planta anual da família das Gramíneas, assim como ao grão ou semente da mesma planta que, reduzido a farinha fornece um dos principais alimentos do ser humano.
O seu gérmen é muito rico em substâncias oleaginosas, dele se extraindo um óleo comestível.
O milho (Zea mays) é originário da América Central e da América do Sul, onde terá sido cultivado há cerca de 5.000 anos a.C., por povos como os Maias, Incas e Aztecas.
O primeiro contato dos europeus com o milho verificou-se em 1492, quando os espanhóis levaram a Colombo amostras de milho.
Trazido para a Europa, o milho começou a ser cultivado em Espanha um ano após a descoberta da América.
Posteriormente, os Portugueses levaram-no para vários pontos do globo terrestre, depois de ter sido introduzido no nosso país, em meados do século XVI, no Baixo Mondego, na zona de Coimbra.
No norte de Portugal são característicos os espigueiros, canastros ou caniceiros, construções usadas para guardar as espigas do milho.
As civilizações do milho
Todas as civilizações dependeram de produtos agrícolas para se manterem: a europeia do trigo e da cevada; a asiática do arroz; a americana do milho, que muitos investigadores consideram a planta mais especializada do mundo.
O milho foi transformado pela mão do indígena que realizou a seleção artificial muito antes da chegada do europeu ao hemisfério.
As espigas de milho teriam, inicialmente, alguns centímetros. Depois de um longo processo de melhoramento realizado pelo Homem pode, atualmente, atingir os 30 cm de comprimento.
A planta de milho, tal qual hoje se conhece, descenderá da hibridação entre o teosinto perene e de um milho primitivo tipo pipoca (Mangelsdorf, 1974).
Os Maias, da América Central, pretendiam que o homem, depois de haver sido feito de barro se transformara em ser vivo por intermédio do milho.
E na América do Sul, o cereal recebeu excecionais cuidados de uma das civilizações pré-históricas mais interessantes e notáveis pelo seu avanço: a civilização inca, que floresceu no altiplano perúvio-boliviano e que foi, pelo seu esplendor, das mais brilhantes que existiram no mundo.
Para o povo inca, o milho era o sustento e o prazer.
Todos os meses do calendário desse povo, que Pizarro arrasou e que construiu uma das civilizações mais adiantadas de que se tem notícia, eram assinalados por alguma cerimónia em que aparecia o milho.
Sementeira e sacrifícios de animais
No mês da sementeira realizavam sacrifícios de pequenos animais ao deus protetor da germinação.
E para garantir o êxito da plantação, os sacerdotes só se alimentavam com o cereal durante todo o espaço de tempo que ia da plantação à germinação.
No quarto mês, havia uma importante celebração na qual era preparado um angu especial, conhecido pelo nome de Samou, empregado, ainda quente, pelas mulheres, para besuntarem os rostos, a soleira das portas e os lugares onde se guardavam os mantimentos.
Em todas as fontes da cidade era, igualmente, aplicado o tal angu.
E havia outra cerimónia imponente, com qualquer coisa de horripilante, no tempo indicado.
Era o sacrifício de lamas brancas, em número de trinta, numa grande solenidade.
Trazidas de todos os pontos do império, eram mortas ao fim de complicado ritual. Com o sangue dos animais misturado ao milho, fazia-se enorme bolo que era dividido em milhares de fatias.
Estas, amontoadas em salvas de ouro maciço, eram apresentadas ao imperador, que as distribuía.
Então, mensageiros especiais eram despachados às diferentes províncias para levarem aos respetivos administradores um pedaço do bolo sagrado. 1
Curiosidade: conselhos para a cultura do milho
Em junho de 1935, o Jornal “A Ordem Nova“, que se publicou em Vila Real, publicou estes conselhos, sobre a cultura do milho:
– As lavouras fundas – 25 a 30 cm – e perfeitas são indispensáveis;
– Devem escolher boas sementes, desprezando as provenientes de espigas mancheadas ou mal formadas;
– A sementeira deve efetuar-se em linhas;
– O melhor espaçamento entre as linhas é de 60 cm, para a terras de regadios, e de 70 a 180 cm para as de sequeiro;
– A profundidade da sementeira mais indicada é, respetivamente, de 5 a 6 cm e de 8 a 10 cm;
– Duas linhas de milho devem alternar com uma de feijão;
– As sachas devem ser pouco profundas, mas repetidas;
– As nitragens indicadas devem fazer-se com cuidado e na ocasião das sachas;
– Do bom crédito das mondas resulta em grande parte o bom êxito da seara;
– A amontoa deve ser perfeita;
– Feitas das mondas, os milheirais devem ficar com o espaçamento entre si de 25 cm e de 30 a 40 cm, respetivamente nas terras de regadio e de sequeiro;
– As regas devem ser abundantes mas sem excesso;
– O desbandeiramento deve ser feito o mais tarde possível;
– Nunca se deve desfolhar;
– Deve-se arrancar e queimar o «morrão»;
– A colheita deve ser feita a tempo e as maçarocas bem secas.” 2
As desfolhadas
Quando o milho atingia o seu estado de maturação era cortado e transportado para as eiras e estava pronto a ser desfolhado.
As desfolhadas eram feitas geralmente à noite.
Os lavradores contactavam um certo número de pessoas, geralmente os vizinhos, de acordo com a quantidade de milho que havia para esfolhar.
Usualmente as pessoas faziam o serviço sem qualquer remuneração pecuniária, por favor, aceitando apenas comida e bebida.
Durante a desfolhada as pessoas cantavam canções tradicionais, havendo despiques entre vários grupos.
Um dos melhores divertimentos era o aparecimento da espiga rainha, espiga de milho vermelho
Mandava a tradição que quem a encontrasse tinha o direito de abraçar todos os circunstantes, ou, dependendo da região, de roubar um beijo a uma donzela.
Se aparecesse uma espiga com “filhos”, quem a encontrasse teria de acender uma vela e colocar a espiga numas alminhas, que se encontram num cruzamento de caminhos, para espantar os maus espíritos.
No final da desfolhada, serviam-se aos presentes diversas iguarias e vinho.
Depois cantava-se e dançava-se ao som de concertinas, violas e harmónicos.
Os homens escolhiam o seu par e todos entravam na dança.
Os moços solteiros aproveitavam estes serões para fazerem a corte à rapariga que mais lhes agradava.
As espigas era, depois, guardadas nos canastros ou espigueiros.
1 “História da História do Mundo” (texto editado e adaptado) | 2 “A Ordem Nova”, junho de 1935