Religião Popular e Religião Cívica | Opinião

Religião Popular e Religião Cívica

Desde o começo da sua existência, o Homem procurou sempre encontrar explicações para os fenómenos do mundo que o rodeia.

Desde a respetiva origem às alterações resultantes das ações climáticas e das estações do ano que interferem no ciclo de renascimento da natureza e dos vegetais, essencial à preservação da vida e à sobrevivência da comunidade humana.

E, em todas as culturas, a explicação encontra-se na vontade dos deuses cuja ação criadora deve ser celebrada para assegurar a sua continuidade.

E, desse modo, através do rito, o Homem participa na sua ação criadora.

O mesmo é dizer, perpetuando através da tradição o ciclo de perpétuo renascimento da vida.

As festividades populares que chegam até nós, mormente as festas e romarias populares, têm a sua origem nas mais remotas crenças dos nossos ancestrais que nos foram transmitidas graças à sua preservação sob a forma de manutenção da tradição.

Ao longo dos tempos, foram adquirindo novas formas, nomeadamente as que resultam da nossa conversão ao Cristianismo, mas ainda assim conservando a essência da sua celebração e o seu real significado.

Quer isto dizer que as festas que o povo realiza aos seus padroeiros e santos venerandos constituem celebrações cujas raízes mergulham no que de mais profundo existe na razão humana.

Desde os finais do século XIX, tem vindo a assistir-se à tentativa de sobrepor um novo tipo de celebrações, mais de caráter cívico.

Procura-se, de algum modo, substituir as tradicionais festividades religiosas do povo e, desse modo, instituir uma “religião cívica”.

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As festividades do Dia da Árvore e outras

Inserem-se nesse plano as festividades do “Dia da Árvore” e a comemoração de efemérides de caráter político, geralmente estabelecidas como feriados oficiais, tais como a data de atribuição da carta de foral ou a elevação de uma localidade a freguesia, vila ou cidade.

Não raras as vezes, o empenho vai ao ponto de pretender-se substituir as datas festivas dos próprios feriados municipais cuja instituição tem na origem a mais profunda tradição popular.

Esta tentativa de falsificação vai ao ponto da invenção de novas letras e novas coreografias para o nosso folclore.

Isto numa clara manifestação de propaganda municipal e turística que nada tem a ver com as verdadeiras tradições locais mas antes com operações de marketing.

Em regra, a comemoração de tais efemérides não colhe a adesão do povo.

Apenas porque, na realidade, não passam de construções artificiais que nada têm a ver com a sua forma de encarar o mundo que o rodeia. Resultam apenas de sucessos políticos que pouco o nada alteram o seu modo de vida.

Adesão popular não se impõe

Não são as posturas municipais nem os decretos governamentais que vão suprimir a religiosidade do povo português.

Este continuará sempre devoto aos seus santos padroeiros e a festejar os dias que lhes são consagrados, da mesma forma que os nossos ancestrais veneravam as mais misteriosas forças da natureza com a mais profunda veneração que devotavam aos deuses que as representavam.

As festividades locais devem sempre ter em consideração a religiosidade do povo e, por conseguinte, combinar a componente profana e cívica com a tradição cristã e a devoção popular.

Sem a participação da Igreja ou seja, da comunidade cristã, com os seus andores e pendões e sobretudo a sua devoção, nenhuma festa assume um caráter verdadeiramente popular por mais importante que seja a efeméride que se pretenda celebrar.

O Minho visto por José Malhoa | Textos e opiniões

Carlos Gomes, Jornalista, Licenciado em História