São João e o Solstício de Verão | Textos

São João e o Solstício de Verão

Entrámos em Junho e com ele no solstício do Verão.

Salta-se a fogueira pelo São João, brinca-se com alcachofras e martelinhos, tréculas e zaquelitraques, canta-se e dança-se.

Pela calada da noite, invadem-se os quinteiros, assaltam-se as eiras e roubam-se vasos com plantas, carroças e carros de bois para seguidamente os levar para o centro da povoação.

São as festas são joaninas, assim designadas em virtude da Igreja Católica ter atribuído a esta data o nascimento de São João Baptista.

É uma reminiscência de antiquíssimos rituais pagãos relacionados com o Solstício de Verão e ainda com a adoração do fogo.

De resto, o fogo adquiriu desde sempre um carácter sagrado ao ponto de ter sido deificado.

No Porto e em Braga, as suas gentes vivem as festas são joaninas com particular intensidade.

O Barredo e a Ribeira no Porto enchem-se de povo e a alegria e animação dura até às tantas da madrugada.

Em Lisboa, as festas solsticiais abrangem todo o mês de Junho, associando São Pedro e Santo António aos festejos de São João.

 

O nascimento de Santo António em Lisboa deve ter contribuído para que os festejos lhe tenham sido dedicados, popularizado ao ponto de muitas pessoas pensarem erradamente ser ele o patrono desta cidade.

As fogueiras na chegada do Verão

Desde tempos remotos, o homem celebrava a chegada do Verão acendendo enormes fogueiras, cantando e dançando em seu redor.

É a chegada do lume novo, um rito cuja sacralidade original se foi perdendo e que chegou até nós, transmitido de geração em geração, assegurada pela própria tradição.

Entre os gregos e os romanos, competia às Vestais – sacerdotisas dos templos dedicados a Vesta – a tarefa de preservar aceso o fogo sagrado.

Entre nós, persiste o costume de acender o lenho na noite de Natal ou na passagem do ano e o círio pela Páscoa.

Manda a tradição católica que, à beira da pia batismal, os padrinhos transportam a vela acesa quando o batizado não o pode fazer se ainda for demasiado jovem. Mas, fá-lo-á quando chegar a altura de confirmar o seu batismo cristão.

O fogo é luz e festa

É que o fogo é a luz que nos ilumina e mostra a Verdade e a Vida.

É ainda o fogo que nos aquece e afaga a nossa rude existência.

Ele é elemento purificador que constitui um dos quatro elementos – os outros são a Terra, o Ar e a Água.

Mas o fogo é também festa.

Desde a sua descoberta, o Homem aprendeu a produzi-lo e manipular ao ponto de conseguir iluminar os céus e a terra com uma verdadeira constelação de alegria, salpicando-o de lágrimas e girândolas de cores e formas variadas, compondo na abóboda celestial um autêntico hino ao Criador.

Afinal de contas, foi Ele quem, pela primeira vez, nos enviou o fogo sob a forma de um raio ou cuspiu das entranhas de um vulcão – eis o gesto primordial da criação que é ritualizado pelo homem desde os tempos em que Adão e Eva foram expulsos do paraíso por um anjo que empunhava uma espada de fogo.

Trabalhos agrícolas e festas populares

É tempo de proceder à ceifa do trigo, do centeio e da cevada, de sachar o milho, sulfatar a vinha e crestar o mel das colmeias.

Mas também é altura de festejar o São João e saltar a fogueira.

Desde o solstício de Verão até ao equinócio do Outono, altura em que decorrem as tradicionais Feiras Novas em Ponte de Lima que encerram o ciclo das romarias do Alto Minho, é tempo de festa, de estúrdia e de arraial.

E, a fazer jus à fama da pirotecnia, não há verdadeiramente festa sem o luminoso colorido do fogo-de-artifício e o estardalhaço dos foguetes.

O folclore do nosso povo conserva raízes que nos transportam à origem da própria civilização humana.

Carlos Gomes, Jornalista, Licenciado em História | Imagem