Duas romarias antigas no Algarve
Duas romarias no Algarve
Correspondendo integralmente à antiga província com o mesmo nome, criada em 1936, o Algarve é a região de Portugal Continental que se situa mais a sul.
Está limitada, a norte, pelo Baixo Alentejo, a leste, por Espanha, com fronteira no rio Guadiana, e, a sul e a oeste, pelo oceano Atlântico. A sua superfície (4991 km2) representa apenas 5,7% do País e corresponde apenas a um único distrito administrativo, Faro.
A população do Algarve concentra-se no litoral sul, onde se situam as principais cidades, como Faro, Lagos, Portimão, Olhão, Tavira e Vila Real de Santo António, ao passo que o interior apresenta uma dispersão do povoamento por pequenos lugares. Ler+
Festa da Mãe Soberana – Loulé
Na última curva da estrada estreitinha que liga Loulé ao Santuário de Nossa Senhora da Piedade, alcandorado no alto da colina, começa a ouvir-se o clamor da multidão.
Milhares de lenços brancos acenam e os gritos de incitamento são cada vez mais altos. A banda começa então a tocar o «rompe-rompe», uma marcha rápida composta só para tambores, há cerca de 200 anos, por mestre Campina, sapateiro de profissão.
Os oito homens que carregam o andor de 18 arrobas onde está a imagem da Mãe Soberana, com o Filho morto nos braços, iniciam então uma corrida desenfreada ladeira acima, seguidos pelos músicos e milhares de fiéis.
À sua passagem, a mole humana que se espraia por toda a colina solta vivas emocionados.
E assim, no segundo Domingo depois da Páscoa, desde o séc. XVI, quando foi erigido o santuário cujos azulejos e pinturas do texto estão enegrecidos pelo fumo de milhares de velas ali acesas pelo povo para pagar promessas.
No Domingo da «Festa Grande», o andor é retirado em ombros do interior da igreja de S. Francisco e sai em longa peregrinação citadina, acompanhada pelo estralejar dos foguetes e por cânticos de exaltação.
Os fiéis exortam a Mãe Soberana a conceder-lhes as graças pedidas, em tom alegre, mesmo festivo. Um dos apelos mais frequentes é este: «Mãe, dá-me que eu careço!». (…) 1
Mãe Soberana
(Dedicada aos Homens do Andor)
Guardas o sofrimentos em teu olhar
Jovem em flor, doce Mãe da Piedade
Em Ti, dorme o trigo da Eternidade
Dentro do teu peito o Sol vem brilhar.
Por Ti, Mulher, outra Luz se anuncia
As tuas mãos afagam fruto novo
Soberana do Amor, Canto do povo
És jardim onde amanhece a alegria.
Que mistério tão grande teu viver
Seguras, crente, nosso padecer
Arde na tarde em nós Teu coração.
Contigo subiremos a calçada
Teu manto nos eleva, Imaculada
Nascente que nos dás a Salvação.
Pe Carlos Aquino
Festa de Nª Sª do Carmo – Fuzeta
Religiosamente falando, a padroeira da Fuzeta é Nossa Senhora do Carmo. Mais do que a denominação do calendário litúrgico, as gentes da Fuzeta transformaram as preces à «Senhora dos Navegantes» numa súplica pela protecção contra a fúria do mar.
A pesca do bacalhau na Terra Nova ou na Gronelândia era dura, as embarcações precárias e as condições de trabalho terríveis. Um escapulário usado como que colado ao corpo acompanhava sempre os pescadores.
As pequenas imagens eram benzidas antes da partida, e na localidade ainda permanecem recordações dessa cerimónia.
A procissão remonta a meados do século passado, quando, ao haver conhecimento de um naufrágio, foi a aldeia em peso pedir à padroeira a salvação dos homens em perigo. Caso se salvassem haveria de ser feita, a partir daí, sentida homenagem e esplendorosa festa.
Não há registos fidedignos desse hipotético salvamento, mas a tradição enraizou-se. Com o passar dos anos a festa da Senhora do Carmo passou a assinalar fundamentalmente o regresso dos pescadores bacalhoeiros.
Mudam-se os tempos…
A extinção da «frota branca» (como era conhecida a frota que se dedicava à pesca à linha do bacalhau), levou ao retorno da data festiva às origens, a Senhora do Carmo, cujo dia litúrgico é alvo de manifestações semelhantes em muitas das comunidades piscatórias do Mediterrâneo.
A procissão ao longo da Ria Formosa, com as embarcações, ainda é uma sentida e ingénua homenagem dos homens do mar à sua padroeira.
Vai a imagem da Igreja do Livramento, onde está recolhida durante o ano, até ao cais da Fuzeta, para regressar 48 horas depois em caminho inverso.
A este passeio marítimo, realizado na véspera do 16 de Julho, junta-se uma mais clássica procissão no dia seguinte, pelas ruas da vila, culminando com a bênção das embarcações junto ao cais.
Nos seus votos continuarão, talvez, a pedir protecção contra os naufrágios, mas suplicarão certamente o fim da crise que se tem abatido sobre a actividade pesqueira da Fuzeta.1
Imagem em destaque retirada daqui. 1 In GUIA Expresso “O melhor de Portugal” – 12 – Festas, Feiras, Romarias, Rituais